sexta-feira, 20 de junho de 2014

O escravo da Casa Grande e o desprezo pela esquerda


Malcom X comparou, certa vez, os negros que defendiam a integração na sociedade norte americana com escravos da casa. Para defender suas pequenas posições de acomodação na ordem escravista, buscavam imitar seus senhores, copiar seus maneirismos, usar suas roupas, sua linguagem, adotando o nome da família de seus senhores. Daí o “X” no lugar do sobrenome do revolucionário norte americano.
Não é de se estranhar que os escravos da Casa Grande se incomodassem com as revoltas vindas da Senzala, pois poderiam atrapalhar sua instável acomodação, sua sobrevivência subserviente.
Dois textos recentes me chamam a atenção, não sei se produzidos pela mesma pena, mas certamente movidos pelo mesmo ódio e desprezo contra a esquerda em nosso país. Um deles é de autoria do sociólogo Emir Sader neste blog (“Não é a Copa, imbecil, são as eleições), que recentemente comparou os manifestantes a cachorros vira-lata, outro é o editorial do Brasil de Fato de 03/06/2014 (“Eleições presidenciais e o papel do esquerdismo“) que, não contente em se aliar ao campo de apoio a Dilma, abriu as baterias contra a esquerda – aquela mesma que em muitas situações apoiou esse jornal, não apenas nas campanhas para sua sustentação, mas participando de seu conselho editorial e apoiando nos momentos mais difíceis.
Tanto o sociólogo como o jornal têm o direito de apoiar quem quiserem, de emitirem suas opiniões, mas o que nos chama a atenção é a necessidade de atacar a esquerda e a forma deste ataque. Como em todo o debate que busca fugir do mérito da questão (talvez pela dificuldade em realizar o debate neste campo) lança-se mão de estigmas. É preciso caracterizar os oponentes como “esquerdistas”, “minorias”, “intelectuais vacilantes da academia”, ou mais diretamente de “imbecis”.
Por vezes devemos aceitar o debate não pela qualidade dos argumentos ou a seriedade dos adversários, mas em respeito àqueles que poderiam se beneficiar do bom debate. Para isso temos que supor que o debate é sério e que há uma questão de fundo, ainda que para isso tenhamos que separar uma grossa camada de retórica que visa desqualificar o debate para não enfrentá-lo.
O argumento central da posição expressa nos textos citados, mas explícita e de forma mais clara no editorial do Brasil de Fato, poderia ser assim resumida: os governistas teriam uma “visão ampla da luta de classes”, que articularia três dimensões – a luta social, a ideológica e a institucional – atuando com “firmeza ideológica e flexibilidade tática”; enquanto os supostos esquerdistas “ignoram a correlação de forças” no Brasil e na America Latina e concentram muito mais nas criticas do que nas realizações dos governos “populares”. Isso porque subordinam suas posições, como “vacilantes intelectuais da academia” ou partidos “sem o mínimo peso eleitoral”, não a uma análise concreta de uma situação concreta, mas a uma “fidelidade” ao marxismo ortodoxo.
O resultado desta premissa, segundo a posição expressa, é o seguinte:
“Por isso, para serem condizentes com uma análise concreta de uma situação concreta, os partidos de esquerda sem o mínimo de peso eleitoral, que não conseguem enraizar sua mensagem programática e nem contribuir para o avanço da consciência de classe das massas populares durante as eleições deveriam estar fortalecendo a candidatura de Dilma, mesmo sabendo que o neodesenvolvimentismo em curso não é uma alternativa popular.
Mesmo na posição de um “vacilante intelectual do mundo acadêmico, fiel ao marxismo e de um partido sem peso eleitoral”, gostaria de iniciar o debate afirmando que nossos colegas deveriam seguir, antes de mais nada seus conselhos. Se não vejamos. O erro do “esquerdismo”, que o impediria de realizar uma análise concreta de uma situação concreta, é que “não conseguem identificar frações de classes e seus diversos interesses em torno do governo Dilma”.
Então vamos lá. Quais são as classes e frações de classe que se somam aos governos do PT? O PT produziu-se como experiência histórica da classe trabalhadora que acabou por projetar-se numa organização política que, sem perder a referencia passiva desta classe, assumiu posturas políticas que se distanciam dos objetivos históricos dos trabalhadores. Não se trata de uma questão de origem de classe, mas do caráter de classe da proposta política apresentada em nome dos trabalhadores.
É preciso explicar aos leitores que nós (intelectuais vacilantes fieis ao marxismo) não concebemos a classe social como mera posição nas relações sociais de produção e formas de propriedade, mas como uma síntese de determinações que partindo da posição econômica, devem se somar a ação política, a consciência de classe e outros aspectos. Dessa forma, um setor da classe trabalhadora, ainda que partindo originalmente deste pertencimento, pode em sua ação política e na sua intencionalidade, afirmar outro projeto societário que não aquele que nossa experiência histórica constitui como meta – o socialismo –, sendo capturado pela hegemonia burguesa, naquilo que Gramsci chamou de “transformismo”.
No caso do PT acaba por se consolidar um projeto que tem por principal característica quebrar as reivindicações sociais do proletariado e dar a elas uma feição democrática; despir as formas puramente políticas das reivindicações da pequena burguesia e apresentá-las como socialistas, e tudo isso para exigir instituições democráticas republicanas “não como meio de suprimir dois extremos, o capital e o trabalho assalariado, mas como meio de atenuar a sua contradição e transformá-la em harmonia.” (Karl Marx, O 18 de brumário de Luís Bonaparte, p. 63).
Assim o PT em seu projeto (e prática) de governo apresenta em nome da classe trabalhadora um projeto pequeno-burguês. Mas o PT não governa sozinho, têm razão nossos colegas. É necessário seguir nossa análise para responder quais classes e setores de classe compõem o governo Dilma. Como o centro do projeto político foi deslocado para chegar ao governo federal e lá se manter, são necessárias alianças e até mesmo o programa de reformas democrático-populares é por demais amplo (seria o que André Singer chama de “reformismo forte”), então, rebaixa-se o programa (um “reformismo fraco”) e amplia-se as alianças. Para qual direção?
Não podemos confundir a sopa de letrinhas do leque de alternativas partidárias com segmentos de classe, mas eles são um indicador das personificações desses interesses. As alianças inicialmente pensadas como um leque entorno da classe trabalhadora, setores médios e pequenos empresários, se amplia bastante agora no quadro de um Pacto Social. Vejamos:
“Um novo contrato social, em defesa das mudanças estruturais para o país, exige o apoio de amplas forças sociais que dêem suporte ao Estado-nação. As mudanças estruturais estão todas dirigidas a promover uma ampla inclusão social – portanto distribuir renda, riqueza, poder e cultura. Os grandes rentistas e especuladores serão atingidos diretamente pelas políticas distributivistas e, nestas condições, não se beneficiarão do novo contrato social. Já osempresários produtivos de qualquer porte estarão contemplados com a ampliação do mercado de consumo de massas e com a desarticulação da lógica financeira e especulativa que caracteriza o atual modelo econômico. Crescer a partir do mercado interno significa dar previsibilidade para o capital produtivo.”
Resoluções do 12.º Encontro Nacional (2001). Diretório Nacional do PT (São Paulo, 2001, p. 38).
Este pacto social com “empresários produtivos de qualquer porte” não deixaria de fora nem mesmo os “rentistas”, como se comprovou. A chamada governabilidade exigiria que as personificações partidárias destes interesses estivessem na sustentação do governo, de forma que o governo de “centro” (pequeno-burguês) buscou e conseguiu se aliar com siglas da direita (PMDB, PTB, PP, PSC e outras). Na composição física do governo vemos setores de classes diretamente representados, como o caso dos interesses dos grandes monopólios no Ministérios da Indústria, dos bancos no Banco Central, do agronegógio no Ministério da Agricultura, assim como o controle das agências reguladores e outros espaços formais e informais de definição da política governamental.
Evidente que haverá participação dos “trabalhadores”, mas há aqui uma diferença essencial. Enquanto os setores do grande capital monopolista levam suas demandas à política de governo e as efetivam, as demandas dos trabalhadores são, por assim dizer, filtradas. Enquanto a CUT defendia suas resoluções em defesa da previdência pública, um ex-presidente da entidade assume o ministério para implementar a reforma da previdência, assim como a luta pela reforma agrária é tolerada, mas filtrada e peneirada em espaços intermediários para que os militantes comprometidos não cheguem aos espaços de decisão sobre a questão fundiária e agrária, estes reservados aos representantes do agronegócio.
Podemos ver militantes e personificações de segmentos importantes da classe trabalhadora em áreas como a saúde, a assistência social e outras, no entanto, o espaço efetivo de implementação de políticas ficaria constrangida pelas áreas de planejamento e a lógica da reforma do Estado para produzir a subserviência à lei de responsabilidade fiscal e a política de superávits primárias que tanto agrada aos banqueiros.
Recentemente a presidente Dilma, através da deputada Kátia Abreu (aquela mesmo!!!) da bancada ruralista, garimpava apoio entre os diferentes setores do agronegócio (gado, soja, milho, etc.), enquanto Paulo Maluf posava sorridente ao lado do candidato do PT ao governo de São Paulo em troca de alguns minutos no tempo de TV.
O governo de pacto social com os setores da grande burguesia monopolista e a pequena burguesia que sequestrou a representação da classe trabalhadora, implica nos limites da ação de governo, isto é, impedem o “reformismo forte” e impõe um “reformismo fraco”. Para atender as exigências da acumulação de capital dos diversos segmentos da burguesia monopolista, as demandas dos trabalhadores têm que ser contingenciadas, focalizadas, gotejadas, compensatórias.
Queria-se acabar com a fome e a miséria, mas devemos nos contentar em combater as manifestações mais agudas da miséria absoluta. Queríamos uma reforma agrária (e mais que isso, não é, uma nova política agrícola e de abastecimento, etc.), mas devemos nos contentar com crédito para assentamentos competirem com o agronegócio e assistência para os que não conseguem. Não se revertem as privatizações realizadas e cresce a lógica privatista com as fundações público privadas, as OSs e outras formas diretas ou indiretas de privatização.
O problema é que, mesmo assim, dando tanto à burguesia monopolista e tão pouco aos trabalhadores, a burguesia sempre vai jogar com várias alternativas, e, na época das eleições, vai ameaçar, chantagear e negociar melhores condições para dar sua sustentação. O leque de alianças da governabilidade petista não implica fidelidade dos setores do capital monopolista, adeptos do amor livre, entendem o apoio ao governo do PT como uma relação aberta. Por isso aparecem na época das eleições na forma de suas personificações como partidos de “oposição”.
Tal dinâmica produz um movimento interessante. Amor e união com a burguesia monopolista durante o governo e pau na classe trabalhadora (combinada com apassivamento via políticas focalizadas e inserção como consumidores); e briga com a burguesia e promessas de amor com os trabalhadores na época de eleição!
A abertura da Copa e a hostilização vinda da área VIP contra a presidente funciona aqui como uma metáfora perfeita: eles fazem a festa para os ricos, enchem o estádio com a elite branca e rica, esperando gratidão, mas a elite xinga a presidente.
A artimanha governista é circunscrever a propalada análise concreta de uma situação concreta à conjuntura da eleição e não do período histórico em que esta conjuntura se insere. Graças a esta mágica, desaparece o governo real entre no lugar um mito que resiste ao neoliberalismo contra as forças do mal igualmente mitificadas e descarnadas de sua corporalidade real. É o odioso “neoliberalismo”, que vai retroceder nos incríveis ganhos sociais alcançados e desestabilizar os governos progressistas na America Latina. Vejam, nos dizem, como são piores que nosso governo, precisamos derrotá-los para evitar o retrocesso e as privatizações. Mas uma vez derrotados eleitoralmente os adversários de direita… quem privatizou o Campo de Libra? Colocando exército para bater em manifestantes? Quem aprovou a lei das fundações público-privadas que abriu caminho para a privatização da saúde e outras? Quem aprovou a lei dos transgênicos, o código florestal e de mineração?
Não são iguais, é verdade. São duas versões distintas disputando a direção do projeto burguês no Brasil. Um o capitalismo com mais mercado e menos Estado, outro o capitalismo com mais Estado para garantir a economia de mercado.
Precisamos circunscrever a análise da correlação de forças ao momento eleitoral para evitar a derrota do governo Dilma, vejam, “mesmo sabendo que o neodesenvolvimentismo em curso não é uma alternativa popular”!
Então, comecemos por aí: o atual governo NÃO É UM ALTERNATIVA POPULAR! Já é um bom começo. Mas tenho uma péssima notícia… também não é neodesenvolvimentista, seja lá o que isso queira dizer. É um governo de pacto social que, partindo de um programa e uma concepção pequeno-burguesa, crê ser possível manter as condições para a acumulação de capitais o que leva a uma brutal concentração de renda e riqueza nas mãos de um pequeno grupo, ao mesmo tempo em que, pouco a pouco e muito lentamente, apresenta a limitada intenção de diminuir a pobreza absoluta e incluir os trabalhadores na sociedade via capacidade de consumo (bolsas, salários e crédito, etc.).
Ora, o que deve fazer a esquerda “sem o mínimo de peso eleitoral, que não consegue enraizar sua mensagem programática e nem contribuir para o avanço da consciência de classe das massas populares”? Dizem os governistas: votar na Dilma. No entanto, desculpe a insistência de quem faz análise concreta de situação concreta não só quando chegam as eleições e água bate na bunda; mas, e se for exatamente este processo de pacto social e de implementação de um social-liberalismo que está impedindo o “avanço da consciência de classe”? Depois de 12 anos de governos desta natureza a consciência de classe está mais avançada que estava nos anos 80 e 90? Nos parece que não.
Se somos tão insignificantes, irrelevantes e idiotas… por que é necessário bater desta forma na esquerda? Pelo simples fato que nossa existência, a existência de uma ESQUERDA (não a pecha de esquerdismo que tenta se impor contra nós como estigma), é a denuncia explícita dos limites e contradições que o governismo e seus lacaios querem jogar para debaixo do tapete.
Para manter a “imagem” do governo petista (Sader está preocupado com a imagem) é preciso uma operação perversa: atacar quem denuncia os limites desta experiência, não importando o quanto desqualificado e hipócrita seja o ataque, estigmatizando, despolitizando o debate. Primeiro foi necessário destruir a esquerda dentro do PT e sabemos os métodos que foram usados nesta guerra suja. Na verdade o que vemos agora contra a esquerda fora do PT é uma projeção do ataque vil e brutal que companheiros da esquerda petista sofreram e (aqueles que ainda resistem lá no PT) ainda sofrem (esquerdistas, isolados das massas, sem expressão eleitoral, irresponsáveis, etc.). E depois que conseguirem isolar, estigmatizar e satanizar a crítica de esquerda a essa experiência centrista e rebaixada de governo? Quando forem atacados pela direita que não guarda nada a não ser desprezo para com os escravos da casa grande?
As manifestações seriam, segundo os governistas, uma ofensiva da direita para sujar a imagem bela e idealizada do governo e o esquerdismo joga água neste moinho. Interessante que a necessidade de uma análise concreta de uma situação concreta, da correlação de forças e das classes não é necessária quando se trata das manifestações. MTST, garis, metroviários, professores, são todos imbecis marionetes da direita, manipulados por ela e quando pensam lutar por seus direitos e demandas estão fazendo o jogo da direita. Somos nós que fazemos o jogo da direita… tem certeza?
De nossa parte, não nos incomodamos, porque não esperamos nada mais que isso como consequência do progressivo, e triste, processo de descaracterização e rebaixamento político. Não será a primeira vez que a política pequeno-burguesa, que se diz representante de todo o povo, se alia ao trabalho sujo da direita para combater a esquerda.
Respondemos àqueles que acreditam que estamos isolados com as palavras de Lenin, com quem aprendemos a fazer análise concreta de uma situação concreta:
Pequeno grupo compacto, seguimos por uma estrada escarpada e difícil, segurando-nos fortemente pela mão. De todos os lados, estamos cercados de inimigos, e é preciso marchar quase constantemente debaixo de fogo. Estamos unidos por uma decisão livremente tomada, precisamente a fim de combater o inimigo e não cair no pântano ao lado, cujos habitantes desde o início nos culpam de termos formado um grupo à parte, e preferido o caminho da luta ao caminho da conciliação. Alguns dos nossos gritam: Vamos para o pântano! E quando lhes mostramos a vergonha de tal ato, replicam: Como vocês são atrasados! Não se envergonham de nos negar a liberdade de convidá-los a seguir um caminho melhor? Sim, senhores, são livres não somente para convidar, mas de ir para onde bem lhes aprouver, até para o pântano; achamos, inclusive, que seu lugar verdadeiro é precisamente no pântano, e, na medida de nossas forças, estamos prontos a ajudá-los a transportar para lá os seus lares. Porém, nesse caso, larguem-nos a mão, não nos agarrem e não manchem a grande palavra liberdade, porque também nós somos “livres” para ir aonde nos aprouver, livres para combater não só o pântano, como também aqueles que para lá se dirigem!
(Lenin, Que fazer?, São Paulo: Expressão Popular, 62)
MAURO IASI
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quarta-feira, 14 de maio de 2014

PT é o Poder?




As eleições vão se aproximando e os ânimos vão ficando cada vez mais à flor da pele, principalmente quando o assunto da mesa de bar é o PT. Temos aqueles que entendem o PT como um partido marcado por políticas assistencialistas, apelidado pelos mais ‘direitosos’ de “bolsa esmola’. Temos os que consideram positivas as mudanças na qualidade de vida depois do partido, mas que se sentem insatisfeitos pelo declínio do governo Dilma. Existem os ‘haters’ que não suportam os “PTralhas” e “corruPTos” "'que destruíram a Petrobras", os que entendem o partido como socialista, os que entendem como social-democrata, os que entendem como direita, e claro, os petistas que vivem maravilhados pelo partido. Ora, mas o que todas essas visões tem em comum? Olhando assim aparentemente nada, mas talvez seja exatamente essa falta de concretude nas diferentes concepções, que nos trace um caminho claro para compreender o que é o Partido dos Trabalhadores. 

O PT carece de objetividade no que cerne à sua posição política. O exemplo disso é que o governo Dilma vem reforçando sua aproximação com o PMDB através de alianças já definidas em nove estados do país para as eleições deste ano. Além disso, recentemente tive acesso ao trabalho de um estudante de estatística da USP, com o título de "Há Partidos Políticos no Brasil?", que reunia votos de 75 senadores em 36 decisões do ano de 2012 afim de compreender o que era realmente uma oposição ao governo. Entre gráficos e programas matemáticos, o resultado foi surpreendente; O PT é extremamente coerente nas votações do senado e os demais partidos (com exceção do PSOL, DEM e PSDB), acabam votando junto com PT na maioria das decisões. Ou seja, o PT tem um senado fortíssimo, uma oposição mínima e consegue governar tranquilamente com sua base pelega e suas alianças obscuras. 

Além de todo seu aparato armado dentro do aparelho burocrático, o PT conta com um excelente marqueteiro que elegeu seis presidentes na América Latina. João Santana é a personificação da força alienante da propaganda como um dos principais Aparelhos Ideológicos do Estado, de dar inveja à Althusser. E por falar em Aparelho Ideológico, o partido também vem lidando muito bem com a Rede Globo, a presidenta Dilma continua fazendo vistas grossas no que desrespeito às questões de concessão da emissora. De modo, que aquela vaga ideia de ‘lei da mídia e democratização da informação”, mencionada aqui após o exemplo de Cristina Kirchner na argentina, acabou caindo no esquecimento da presidenta.

Diante disso tudo, é fato que para governar o Brasil, o PT se descaracterizou como esquerda e inverteu sua ideologia, tornando-se um partido barrado pela lógica burguesa. E apesar das transformações que trouxe para Brasil, apesar do crescimento da classe média, do sucesso do Bolsa Família, do maior poder de compra do trabalhador, do equilíbrio da inflação e do maior número de jovens nas universidades, o PT falhou em cumprir o seu papel como esquerda. Não quero me parecer distante da realidade do trabalhador, pois compreendo que a vida de algumas pessoas de fato mudou pra melhor nesses seis anos de PT. No entanto, essas transformações apenas expõe as profundas contradições do capitalismo, que é incapaz de conceder o mínimo para que as pessoas sobrevivam. O PT apenas aumentou o nosso poder compra e hoje enquanto alguns podem gastar seus salários em shoppings, fazer viagens de avião e comprar seus aparelhos eletrônicos, continuam sendo explorados de domingo à domingo, sofrendo as violências de um sistema de saúde pública precário, viajando em condições precárias de transporte público para chegar em seus empregos. Enquanto essa mesma classe média se regozija com seus salários, uma parcela permanece paupérrima à linha da miséria, enfrentando seca no nordeste e falta de saneamento básico nas favelas.

A exploração no Brasil segue voraz, a desigualdade grita e o capitalismo permanece selvagem com seus altos investimentos do empresariado, que busca lucrar cada vez mais com os megaeventos. O Partido dos Trabalhadores hoje vive as projeções vermelhas de uma pseudo-esquerda, que preserva imagens e símbolos puramente performáticos de uma bandeira que já não existe, uma bandeira que foi rasgada e pisada pelos traidores da classe trabalhadora. Enquanto sustenta essa imagem de esquerda o partido se constitui mais liberal do que nunca, conciliando as classes e dançando cautelosamente no seu jogo maquiaveliano de poder. Porque poder na verdade, vem sendo o único motivo pela qual o PT permanece firme todos esses anos

Matheus Ribeiro
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domingo, 6 de abril de 2014

Ensaio sobre realidade e manipulação

   Os fatos, muitas vezes, nada mais são do que eventos periféricos, porém verdadeiros, de algo que se quer omitir ou fazer passar como real.
  Informação é meramente a declaração de fatos, ações ou divulgações em si, porém, o conhecimento é a interpretação e aprendizado das informações obtidas, com seleção crítica do que devemos absorver.
  É, de fato, difícil explicar tão eloquentemente por que  mostrar apenas uma parcela da realidade pode ser uma forma de mentira. Para não ser ludibriado por ela, torna-se necessário, como diz o anúncio, ter muito cuidado com a informação que se recebe. Tarefa difícil, evidentemente.
  Os meios de comunicação social, particularmente os que influenciam um vasto número de pessoas, “podem limitar-se a não refletir a verdade. O sistema é muito simples: omitir o assunto” diz Ryszard Kapuscinski, autor de "Os cínicos não servem para este ofício. Conversas sobre o bom jornalismo"
  Deixo aqui em questão, material de reflexão sobre as realidades e seus parâmetros, talvez até seus níveis. Níveis de realidade. Níveis de verdade. 


OBS:

Era o final de 1987 e o início de uma das mais duradouras e premiadas parcerias entre cliente _a Folha_ e agência, a W/Brasil, a terceira maior agência de propaganda do país. O filme "Hitler" ganhou inúmeros prêmios de propaganda em 1988, inclusive o Leão de Ouro no Festival de Cannes, o mais importante de todos. É um dos dois únicos comerciais brasileiros e ibero-americanos na lista dos cem melhores de todos os tempos, publicada em 2000 por Berneci Kanner. 

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segunda-feira, 31 de março de 2014

Os resquícios da Ditadura militar - Frei Betto

'Enquanto os torturadores e assassinos não forem punidos, o conjunto de nossas Forças Armadas continuará a ser confundido com eles' (Foto: Arquivo Pessoal)
"Enquanto os torturadores e assassinos não forem punidos, o conjunto de nossas Forças Armadas continuará a ser confundido com eles." (FOTO: Arquivo Pessoal)

   Carlos Alberto Libânio Christo, de 69 anos, mais conhecido como Frei Betto. Sempre lembrado quando o assunto é Ditadura Militar e Igreja Católica, e por sua atuação em prol dos direitos humanos e a favor dos movimentos populares, Frei Betto é um religioso dominicano, jornalista e escritor com 58 livros publicados, entre eles “Batismo de Sangue”, prêmio Jabuti de melhor livro de memórias de 1982, que foi levado às telas do cinema pelo diretor Helvécio Ratton, em 2007. Além de “Cartas da Prisão”, “A mosca azul”, “Calendário do Poder”, entre outros.
Em 1966 entrou para a Ordem dos Dominicanos, da Igreja Católica, e, em 1969, por sua atuação contra a Ditadura Militar, foi condenado a quatro anos de prisão. Neste Papo de Domingo, ele fala sobre um dos episódios mais tristes da história do Brasil e sobre o dia que durou 21 anos. Frei Betto afirmou que ainda há muitos resquícios da ditadura no país, e que a CIA (Agência Central de Inteligência) financiou a Marcha da Família, em 1964; Diz também que enquanto os torturadores e assassinos envolvidos não forem punidos, o conjunto das Forças Armadas continuará a ser confundido com eles. Além do atraso social, da censura à Imprensa, Lei de Anistia, ele afirma que o Golpe é de 1º de abril e não 31 de março, como afirmam os militares. Frei Betto fala sobre a importância de se contar e revelar os fatos e a abertura dos arquivos da ditadura e que quem foi à Marcha da Família 2014, chegou 50 anos atrasado. “Não se constrói uma nação sem memória histórica”.
DL - Frei Betto, existem resquícios da Ditadura na sociedade brasileira de hoje e nos políticos?
Frei Betto: Muitos resquícios. Primeiro, os que, em nome do Estado, praticaram crimes ao longo dos 21 anos de ditadura continuem imunes e impunes. Temos ainda a esdrúxula lei da anistia, que isenta os torturadores e assassinos de punição; o sistema político; o encastelamento das Forças Armadas, que não abrem os arquivos da ditadura; a Polícia Militar, quando deveríamos, como nos países civilizados, ter apenas polícia civil. E, na cultura do brasileiro, ganha terreno a lei do talião, o “direito” de fazer justiça com as próprias mãos, o que se reflete também na redução da maioridade penal, como se a criminalidade de menores fosse falta de punição, e não de educação.
DL - Socialmente, o que representou o Golpe de 1964 em termos de atraso cultural, jornalístico, na música e etc.?
FB: O vocábulo que define o Brasil dos anos 1960 é o adjetivo novo. Tudo era novo - a bossa nova, o cinema novo, a nova capital. Havia um amplo movimento em prol das reformas de estruturas, na época chamadas reformas de base (agrária, política, tributária, etc). Tudo isso foi abortado pelo golpe militar. A imprensa ficou sob severa censura. A cultura, entretanto, resistiu, principalmente através da música e do teatro. Mas tudo seria bem melhor se a ditadura não tivesse sufocado tantos talentos e tantas iniciativas artísticas.
DL - O senhor apoia a Comissão da Verdade? A sua implantação demorou muito? Porque um país como a Argentina julgou os torturadores e militares e o Brasil não?
FB: A Comissão da Verdade veio tarde, mas é bem-vinda. Lamento apenas que não seja também Comissão da Justiça. Enquanto os torturadores e assassinos não forem punidos, o conjunto de nossas Forças Armadas continuará a ser confundido com eles, ao contrário do que ocorreu nos países do Cone Sul (Argentina Chile e Uruguai), onde as responsabilidades foram devidamente apontadas e sancionadas.
DL - Em entrevista ao site UOL, o senhor disse que a CIA financiou a Marcha da Família. Esta marcha foi fundamental para o Golpe?
FB: Sim, pois o povo brasileiro é muito religioso, muito mais nos anos de 1960. Trouxeram dos EUA o padre Peyton, pároco de Hollywood, financiado pela CIA, para promover as Marchas da Família com Deus pela Liberdade. Isso aguçou o anticomunismo da população, criando o caldo de cultura favorável à quartelada.

DL - Os militares dizem que o Golpe é de 31 de março. Para o senhor o Golpe é de 31 de março ou de 1º de abril?
FB: Para mim a data correta é 1 de abril. Como é o Dia da Mentira, os militares recuaram um dia. Tiveram vergonha da data e ainda hoje têm vergonha de assumir todo o sofrimento que impuseram à nação, ceifando centenas de vidas jovens.
DL - Onde o senhor estava e como recebeu a notícia do Golpe?
FB: Estava em Belém (PA), participando do Encontro Latino-Americano de Estudantes, que se desfez tão logo chegou a notícia do golpe. Eu era da direção nacional da Ação Católica Brasileira, vista pelos militares como subversiva. Por isso me refugiei em casa de um amigo, até a poeira baixar e eu poder retornar ao Rio, onde morava. Mas na madrugada de 5 para 6 de junho o apartamento em que eu morava foi invadido pelo serviço secreto da Marinha (CENIMAR) e fomos todos presos, conforme descrevo em meu livro “Batismo de sangue” (Rocco), levado às telas sob direção de Helvécio Ratton.
DL - Por que a história e a Imprensa devem lembrar dos 50 anos do Golpe? Uns defendem esquecer e não dar importância. Outros, em citar e esclarecer os fatos para que não volte acontecer. Mas qual a importância em clarear os fatos e apurar de maneira definitiva aqueles 21 anos?
FB: Não se constrói uma nação sem memória histórica. E é preciso que nada daquilo se repita. A Ditadura Militar deve ser tema recorrente nas escolas, movimentos sociais, associações etc. Dei minha contribuição com o livro acima citado, e também com as obras “Cartas da Prisão” (Agir) e “Diário de Fernando - nos cárceres da Ditadura Militar brasileira” (Rocco).
DL- Não resistir ao golpe fortaleceu os militares?
FB: Muito. Qualquer resistência teria impedido o golpe. Mas o governo Jango foi enganado por seu propalado “esquema militar” e a esquerda blefou ao proclamar que, em caso de tentativa de golpe, ela levantaria o povo em armas.
DL - Como o senhor vê a Marcha da Família 2014, pedindo a volta dos Militares ao Poder? É possível afirmar que um tipo de herança golpista vive no DNA de algumas camadas da sociedade brasileira?
FB: Eis minha resposta, Bruno, ‘plagiada’ de uma caricatura que vi não sei em que veículo: Quem foi para a Marcha da Família 2014 perdeu tempo, porque chegou lá 50 anos atrasado.
Do Golpe ao AI-5
“Tempo negro. Temperatura sufocante. O ar está irrespirável. O país está sendo varrido por fortes ventos. Máx: 38° em Brasília. Min: 5° nas Laranjeiras”. Assim, o jornalista Alberto Dines informou a promulgação do Ato Institucional número 5, na capa do Jornal do Brasil, que instituiu a censura prévia à Imprensa, teatro, cinema e música, além da prisão de jornalistas que “subvertessem a ordem social”. No dia 13 de dezembro de 1968, uma sexta-feira, começou a censura oficial. Os números citados por Dines referem-se ao Ato Complementar nº 38, que decretou o recesso do Congresso Nacional, e ao AI-5 propriamente.
O Golpe aconteceu 4 anos antes, em 1964. Com a justificativa de frear a ascensão comunista que assolava a América Latina, apoiados por diversos setores da sociedade civil, entre meios de comunicação, Igreja, empresários, e outros, os Militares resolveram destituir o governo de João Goulart (Jango), através de um levante armado. Jango que havia assumido a presidência, após a renúncia de Jânio Quadros, em 1961, enfureceu os militares com um discurso proferido no “Comício da Central ou das Reformas” (1964), onde ratificou o interesse em realizar as Reformas Básicas (Agrária, Tributária e Política) que gerou insegurança nos empresários e conservadores. A fúria dos militares aumentou quando Jango anistiou militares que descumpriram ordens superiores em uma manifestação, e foram condenados pelo Conselho Militar por Deserção (à morte).
A resposta da oposição ao Comício, que teve a participação de 150 mil pessoas no Rio de Janeiro, foi a “Marcha da Família com Deus pela Liberdade”, em 19 de março daquele ano. Segundo Frei Betto, a Marcha foi fundamental para o Golpe, pois os setores organizados da sociedade embasaram o golpe idealizado pelos Militares. O golpe aconteceu duas semanas depois, começando em 31 de março e concretizado em 1º de abril.
A proposta inicial dos militares e da junta formada por eles, era estabilizar a agitação política e social, e a instabilidade econômica que o país vivia, realizando as eleições diretas, como previsto na constituição de 1946, para Presidente. Porém, oito dias depois do golpe a Junta proclamou o Ato Institucional número 1 (AI-1), que cassou por 10 anos direitos políticos de todos os cidadãos vistos como opositores ao regime, entre militares, civis e políticos, como ex-presidente Juscelino Kubistchek e o próprio Jango.
Em 1965, nas eleições para governos estaduais e com a vitória da oposição, outro Ato foi anunciado, dessa vez o de número 2, que cancelou o resultado da eleição e interviu no Poder Judiciário que saiu da responsabilidade Civil e passou aos Militares. Neste ato, foram extintos os Partidos Políticos e mais políticos foram cassados. Alguns adeptos do Golpe, como Carlos Lacerda, governador do estado da Guanabara (atual Rio de Janeiro) e Magalhães Pinto, governador de Minas, romperam com o Governo.
A partir do AI-2, ficou claro na prática que o Brasil vivia um governo autoritário e não provisório. Em 1966, o AI-3 determinou que a eleição de governadores e vices seria indireta, indicado por um colégio eleitoral estadual. Prefeitos das capitais e de “cidades de segurança nacional” não seriam eleitos, mas sim, indicados por nomeação como Interventores. Os mais populares “Prefeitos e Governadores Biônicos”. O AI-4 convocou o Congresso para votar a nova Constituição, a quinta do período Republicano, iniciado em 1889. A Constituição de 1967 deu poderes plenos ao Presidente da República.
Os ditos anos de chumbo começaram em uma sexta-feira 13 de dezembro de 1968, com a publicação do AI-5, pelo general Artur da Costa e Silva, que se sobrepunha a Constituição de 1967. A primeira consequência desse ato foi o fechamento do Congresso Nacional e mais poder ao Presidente. Foi cassado o privilégio de foro, suspensão do direito de votar e ser votado em eleições sindicais, e a proibição de manifestação. Aplicou-se o conceito de “Liberdade Vigiada”, proibição de frequentar determinados lugares e censura prévia à Imprensa e todo tipo de publicação.
Todos os Atos foram extintos em 1978. Mesmo desgastados com as relatadas torturas, mortes de civis, sindicalistas, intelectuais, jornalistas (como a de Vladimir Herzog, em 1976), políticos opositores, religiosos, os Militares ficaram no poder até 1985, quando o Colégio Eleitoral elegeu Tancredo Neves.
Mesmo com a redemocratização, a abertura política e a promulgação da “constituição cidadã”, em 1988, os crimes do período mais obscuro da história do país não foram julgados, nem esclarecidos. Há ao menos 379 corpos desaparecidos, registrados no “Dossiê de Mortos e desaparecidos Políticos no Brasil”, fora os não registrados.

Adaptado de "Diário do litoral"
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quarta-feira, 26 de março de 2014

O monopólio e poder supremo dos Bancos



O papel dos bancos segundo Lenin é o de intermediário, tendo a função de converter o capital inativo em capital ativo. Esse processo resulta no que chamamos de lucro.
Lenin vê na concentração bancária uma das características do imperialismo moderno.
Entre o reduzido número de bancos, que em consequência do processo de concentração, ficam à frente de toda economia capitalista, verifica-se e acentua-se cada vez mais, como é natural a tendência para chegar a um acordo monopolista, aos ''trust dos bancos"[...]  O aumento da concentração de bancos restringe o círculo de instituições a que podemos dirigir em busca de crédito, com o que aumenta também a dependência da grande indústria a um reduzido número de grupos bancários. 
Verifica-se mais uma vez que a última palavra no desenvolvimento dos bancos é o monopólio.*
Isso caros leitores, Lenin defendia no século XX, vejamos abaixo a contemporaneidade de suas ideias.




O monopólio financeiro na contemporaneidade

O banco Itaú e o Bradesco, preocupados, não tardaram em anunciar a intenção de adquirir bancos menores do país a fim de manterem suas posições no monopólio bancário que vem batendo recordes de lucros a custa do endividamento do povo brasileiro.

E o povo brasileiro foi o último a saber dessas manobras do capital financeiro, sejam as anunciadas aqui, seja a consumada em outros países por arranjos do capital monopolista.
Todo movimento feito dentro da lógica capitalista para domesticar o poder econômico será sempre, além de marcado pela demagogia, condenado ao fracasso. Caso funcione segundo o esperado pelas classes dominantes, o fará debaixo de corrupção e de instrumentalização à favor do capital monopolista. Numa hipótese ou noutra, será sempre uma trapaça. É o caso das chamadas autoridades anti-truste, que já nascem tortas, assentadas no princípio fraudulento de que a concorrência e o monopólio são excludentes entre si, quando na verdade os monopólios, oligopólios e cartéis foram frutos da acumulação de capital proporcionada exatamente pela livre concorrência, intensificando a exploração da classe trabalhadora e consolidando a opressão do poder econômico.No Brasil, como em outras nações ofertadas por suas elites à rapinagem imperialista, o que vale para as autoridades anti-truste vale também para as chamadas agências reguladoras dos setores de energia, petróleo e telecomunicações, para ficar em apenas três áreas estratégicas cobiçadas pelo imperialismo. Seja por ação, seja por omissão, elas regulam o país a favor das grandes empresas internacionais.



A administração FMI-PT, comprometida com o poder econômico, não tomou e não tomará qualquer atitude, a exemplo da complacência com a quebra do monopólio estatal do petróleo para entregar as jazidas nacionais a umas poucas petrolíferas estrangeiras — o mesmo foi feito, entre outros exemplos, com o sistema Telebrás. Os órgãos responsáveis pela medidas antimonopólio o são apenas na teoria. Na prática, ou não funcionam, ou são funcionais ao entreguismo.



O CADE, UMA FACHADA
A propaganda imperialista, repercutida por governos subservientes, diz que todo este aparato existe para conter os eventuais "abusos", como se as práticas rotineiras do poder econômico não disseminassem — via de regra — a exploração, a opressão, a concentração de riquezas, o desemprego, a corrupção, a despolitização e o enfraquecimento das instituições públicas.
Foi sob a mentira de que a truculência do poder econômico é um excesso esporádico a ser contido que a administração de Itamar Franco criou em 1994 o Conselho Administrativo de Defesa Econômica, o Cade, que na prática apita apenas em questões relacionadas a bens de consumo, como fusões entre fábricas de cerveja e de pastas de dente, e nunca no que diz respeito a setores estratégicos da economia nacional dominados pelos monopólios imperialistas.

Assim, o Cade é fundado sob o embuste de que resguardar a concorrência de produtos nas prateleiras dos supermercados é o máximo que se pode fazer contra os monopólios e oligopólios que operam no Brasil. A farsa chega mesmo a ser apresentada como uma política pública das mais importantes, se não primordial. A justificativa é velha, tentando fazer crer que mais concorrência é sinônimo de preços baixos e melhor qualidade.

A lei antitruste brasileira, propondo-se a resguardar a "livre iniciativa" e a "livre concorrência", na prática assegura por omissão as operações de rapinagem do capitalismo monopolista em território nacional, trabalhando contra os interesses do povo brasileiro.
Assim, a breve história do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social está longe de ser o que diz que é, ou seja, a história de um controle democrático das práticas dos grandes conglomerados e corporações. Pelo contrário: o momento é de ofensiva imperialista e de avanço do capital monopolista sobre setores como o sistema bancário, as jazidas de petróleo e o sistema nacional de telecomunicações.

O "ACORDO" COM O EUA
As apreciações sobre os grandes monopólios imperialistas sequer passam pelas agências reguladoras ou por outras instâncias de controle — e de fachada — sob o comando da administração FMI-PT.

Não existe qualquer controle democrático sobre, por exemplo, as decisões dos órgãos antitruste do USA que têm efeitos no Brasil. Para as grandes empresas ianques que mantêm operações em território nacional, o que vale é o princípio da extraterritorialidade das leis anti-monopólio arquitetadas em Washington — princípio que conta com a conivência dos entrepostos locais do USA para que essas empresas possam de fato adotar práticas monopolistas longe de seu território de origem.

Nesse sentido — o da subserviência — foi assinado o "acordo" entre o Brasil e o USA, em outubro de 1999, pelo então ministro da Justiça de Fernando Henrique Cardoso, José Carlos Dias. Acordo que foi aprovado pelo Congresso Nacional em junho de 2002.
O documento fala de "cooperação" entre as chamadas autoridades de defesa da concorrência dos dois países a fim de possibilitar a aplicação de ambas as legislações — a ianque e a brasileira —, mas deliberadamente passa ao largo de dois aspectos cruciais: a inconsistência da legislação antitruste brasileira e a natureza imperialista das decisões anti-monopólio das autoridades do USA. Isso significa que é um acordo com discurso igualitário, mas que serve apenas para que os ditames imperialistas atropelem a frágil legislação nacional.

É o que está por trás da letra jurídica do acordo, que na prática compromete eventuais tentativas de regulação independente do Brasil, apesar do discurso de tom democrático:
"Promover a efetiva aplicação de suas leis de concorrência, por meio da cooperação entre suas autoridades de defesa da concorrência; levando em consideração suas estreitas relações econômicas e observando ser a firme e efetiva aplicação de suas leis de concorrência matéria de importância crucial para o funcionamento eficiente dos mercados e para o bem-estar econômico dos cidadãos dos seus respectivos países; reconhecendo que a cooperação e a coordenação nas atividades de aplicação das leis de concorrência podem resultar em um atendimento mais efetivo das respectivas preocupações das Partes, do que o que poderia ser alcançado por meio de ações independentes".

CLÁUSULA DE ADESTRAMENTO
Mas o acordo de livre-trânsito para a truculência legal imperialista prevê também, sob a mesma linguagem igualitária, que as faces ocultas das práticas monopolistas de empresas ianques no Brasil deverão permanecer em segredo. Está lá:
"A menos que acordado de forma diferente pelas Partes, cada Parte deverá manter o máximo de confidencialidade possível sobre as informações a ela fornecidas em sigilo pela outra Parte, nos termos deste Acordo. Cada Parte deverá se opor, ao máximo possível e em consistência com as leis daquela Parte, a qualquer pedido, de uma terceira Parte, de fornecimento de tais informações confidenciais".
Há, ainda, uma inacreditável cláusula de adestramento dos funcionários do Cade:
"As Partes concordam que é do interesse recíproco de suas Autoridades de Defesa da Concorrência trabalhar conjuntamente em atividades de cooperação técnica relacionadas à aplicação de suas leis e políticas de concorrência. Essas atividades incluirão, dentro de um quadro razoável de recursos disponíveis dos órgãos de defesa da concorrência: o intercâmbio de informações conforme o Artigo III deste Acordo; o intercâmbio de funcionários dos órgãos de defesa da concorrência para fins de treinamento nos órgãos de defesa da concorrência da outra Parte; a participação do pessoal dos órgãos de defesa da concorrência como conferencistas e consultores em cursos de treinamento sobre leis e políticas de concorrência, organizados ou patrocinados por suas Autoridades de Defesa da Concorrência; e quaisquer outras formas de cooperação técnica que as Autoridades de Defesa da Concorrência das Partes acordarem serem apropriadas para os fins deste Acordo".
Assim a grande burguesia internacional conta com as burguesias locais, que são pedaços dela, para passar por cima dos interesses nacionais e deixar o imperialismo à vontade para se apoderar de setores estratégicos, aprofundando a submissão do povo brasileiro.

O Estado da grande burguesia e dos latifundiários, corrupto e conivente, jamais irá regular ou controlar o capital monopolista. Não pode e não quer. Cabe ao povo dar seguimento ao processo em curso e conquistar ele mesmo o controle verdadeiramente democrático, não do capital, que precisa ser derrotado, mas do seu próprio destino.

O que caracterizava o velho capitalismo, no qual dominava plenamente a livre concorrência, era a exportação de mercadorias. O que caracteriza o capitalismo moderno, no qual impera o monopólio, é a exportação de capital.

A passagem do capitalismo à fase do capitalismo monopolista, ao capital financeiro, se encontra relacionada com a exacerbação da luta pela partilha do mundo.


O imperialismo é a época do capital financeiro e dos monopólios, que trazem consigo, em toda a parte, a tendência para a dominação, e não para a liberdade. A reação em toda a linha, seja qual for o regime político... intensifica também particularmente a opressão nacional e a tendência para as anexações, isto é, para a violação da independência nacional.

Os capitalistas não partilham o mundo levados por uma particular perversidade, mas porque o grau de concentração a que se chegou os obriga a seguir esse caminho para obterem lucros; e repartem-no 'segundo o capital', 'segundo a força'; qualquer outro processo de partilha é impossível no sistema de produção mercantil e no capitalismo.



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sábado, 15 de março de 2014

A Crise Da UPP E O Discurso Da Volta Do Tráfico


O tema do “declínio” da UPPs tornou-se uma importante pauta dos jornais e telejornais, que vêm tratando a questão como um problema de “retorno” do poder armado de traficantes, o que implicaria na necessidade de “retomada” dos territórios. Promessa já anunciada por Beltrame. Os eventos recentes na Rocinha, Complexo do Alemão e Complexo da Penha – especialmente a morte do policial militar Rodrigo de Souza Paes Leme, no dia 6 de março, e do subcomandante da UPP Vila Cruzeiro, Leidilson Acácio Alves, ocorrida ontem – evidenciaram uma espécie de “crise” que estaria colocando em cheque o projeto de pacificação. Mas não apenas o poder armado de traficantes, como também a crescente indignação de moradores tem contribuído para a desconstrução do “milagre” sustentado pela imprensa durante mais de cinco de anos.
Na noite desta última terça-feira, dia 11 de março, foi alardeado nas redes sociais que a polícia estaria reprimindo violentamente um protesto realizado por moradores do complexo do alemão contra duas prisões consideradas arbitrárias. Segundo os relatos, moradores teriam sido agredidos e, além do uso de armas menos-letais, policiais estariam disparando tiros de fuzil para o alto, no intuito de dispersar os manifestantes. Qual não foi a surpresa quando, na manhã de quarta-feira, as manchetes de capa dos principais jornais referiam-se aos policiais da UPP como vítimas indefesas dos abomináveis moradores que os teriam encurralado e ameaçado. A imprensa ignorou as denúncias de abuso da força policial e optou por destacar a desvairada hipótese de que a manifestação teria sido ordenada por traficantes. Na versão apresentada, moradores teriam sido obrigados a fechar a Rua Itararé em protesto.
Antes de mais nada, vale destacar que tal hipótese contraria o bom senso e todo o conhecimento acumulado ao longo das últimas décadas por pesquisas realizadas em favelas. Bem se sabe que, de fato, traficantes tendem a impor sua influência sobre as associações de moradores, sobretudo, no intuito de gerir seus recursos financeiros e praticar o clientelismo político. No entanto, seu poder sobre o território não implica, de maneira alguma, a possibilidade de obrigar pessoas a participar de protestos e tampouco o tráfico possui legitimidade suficiente para ter suas demandas abraçadas pelos moradores. A versão inventada pela polícia e enfatizada pela imprensa repousa única e exclusivamente sobre a intenção de deslegitimar a mobilização popular.
Desde a repercussão do caso Amarildo, o suposto “milagre” das UPPs perdeu credibilidade junto à opinião pública e as insatisfações acumuladas dos moradores de favelas ganharam maior respaldo e visibilidade. Ainda assim, a imprensa insiste em centrar a “crise” da UPPs sobre uma suposta “volta do tráfico”, esquivando-se de abordar o tema dos conflitos entre policiais e moradores, que vem acompanhando o projeto desde o princípio de sua implantação. A esse respeito, dois pontos precisam ser destacados.
Em primeiro lugar, o tráfico não deixou de existir ou tampouco perdeu o controle do território em nenhum momento desde a implantação das UPPs, de modo que não faz sentido algum falar em “volta do tráfico”. O resultado das UPPs não foi a expulsão de traficantes ou “retomada” de territórios, mas uma mudança na qualidade da relação entre policiais e traficantes. Se, antes, a polícia realizava incursões pontuais e imprevisíveis para apreender armas, drogas e dinheiro e prender ou matar suspeitos; com o advento das UPPs, passou a privilegiar ocupações militares estáveis, evitando assim os recorrentes tiroteios deflagrados a cada operação policial. A relação entre polícia e tráfico se dava antes pela dialética entre confronto e negociação – o chamado “arrego” –, sendo que o primeiro se prestava em boa medida a testar as assimetrias de força, inflacionando ou tornando desnecessário o pagamento de suborno/extorsão à polícia para a manutenção do funcionamento regular das “bocas de fumo”. No momento posterior às UPPs, polícia e tráfico passaram a compartilhar o mesmo território, de modo que traficantes substituíram consideravelmente a estratégia de combate armado pelo monitoramento da movimentação da polícia pela favela e o aumento da mobilidade e discrição dos seus pontos de venda. Ao mesmo tempo, o velho “arrego” não deixou de existir, continuando sujeito à ética dos policiais que ocupam posições de comando em cada região e à disposição dos traficantes em manter ou não acordos.
Tais mudanças na relação entre tráfico e polícia contribuíram para que menos traficantes armados fossem vistos nas favelas – agora os fuzis aparentes seriam os dos policiais – e, principalmente, para que diminuísse a ocorrência de tiroteios e, consequentemente, também o medo e imprevisibilidade que marcavam o cotidiano dos moradores. Ainda assim, as mesmas lideranças do tráfico continuaram assegurando o monopólio da venda de drogas e atuando como árbitros de disputas locais.
Em segundo lugar, a relação entre policiais da UPP e moradores de favelas jamais foi harmônica, como na fantasia que a imprensa sustentou durante mais de cinco anos. Desde o início, foi problemática a intromissão da polícia no modo como o espaço público era utilizado pelas pessoas. Proibições de bailes funk, churrascos, e mesmo festas infantis que não fossem submetidas à apreciação do comandante da UPP; regulamentação do transporte informal – kombis, vans e mototaxis – e cobrança de taxas ilegais sobre esses serviços; revista sistemática de transeuntes e residências, sem mandado policial; casos de agressão, homicídio e desaparecimentos atribuídos aos policiais das UPP. Estes e outros pontos de conflito tornaram sempre tensa a relação entre moradores e policiais. A maior segurança experimentada em favelas não se deu pela suposta expulsão de traficantes e nem pela oferta do serviço de policiais à população, mas tão somente pela diminuição na frequência dos confrontos armados.
No caso específico dos complexos do Alemão e da Penha, o conflito entre as forças de pacificação e a população local foi sempre ainda mais acirrado. Desde a sua pirotécnica invasão em operações com tanques de guerra e helicópteros, a população vivenciou uma sucessão de arbitrariedades. Tais regiões eram notórias por abrigar a residência e os “tesouros” de todos os principais “donos de morro” do Comando Vermelho, pois eram os únicos complexos de favela onde a polícia encontrava muita dificuldade para penetrar durante suas operações. Diz-se que milhões em dinheiro, armas e barras de ouro encontravam-se enterrados em diversas localidades espalhadas pelos dois complexos de favelas, o que resultou em uma vergonhosa “caça ao tesouro”, promovida por agentes de todas as forças de segurança do Estado. Segundo um policial civil outrora entrevistado: “Tinha até policial aposentado subindo o complexo com pá na mão e mochila nas costas!”. Inúmeras denúncias revelaram que, a serviço deste tipo de interesse, moradores tiveram suas casas sucessivamente invadidas e seus bens roubados, sendo inclusive intimidados e torturados para revelar o esconderijo dos tão almejados tesouros.
Nos primeiros anos de ocupação, os complexos do Alemão e da Penha sequer contaram com uma UPP, ficando o território sob o controle do Exército, notadamente sob um estado de exceção não declarado. Se a convivência entre população, tráfico e Exército já era problemática, a transição do comando local para a Polícia Militar asseverou ainda mais as tensões, pois o histórico de resistência à polícia – e recusa à negociação – que caracterizava o tráfico local nestas áreas dificultou a modificação das relações entre ambos para o modelo pós-UPP supramencionado. O tráfico jamais foi expulso destes complexos ou mesmo suficientemente enfraquecido e as UPPs só puderam sustentar-se nestes territórios conquanto buscassem manter um acordo tácito – ou, quem sabe, até mesmo explícito – de convivência mínima aceitável com os traficantes.
Os confrontos recentes – tanto aqueles com os moradores, quanto com o tráfico – denotam não mais do que a deflagração de conflitos que nunca deixaram de existir. A hipótese mais plausível para explicar a “crise” atual não foca num suposto enfraquecimento da UPP em paralelo ao fortalecimento do tráfico, mas no acúmulo de tensões, transbordado em virtude de uma possível mudança de postura desta instituição no sentido de aumento da repressão. Pode ser que o tráfico tenha finalmente se ajustado às novas condições, reestruturando-se de maneira significativa para fazer frente à polícia, mas sugerimos que seja o aumento da atitude repressiva da polícia e não propriamente o seu enfraquecimento, o principal responsável pelos conflitos recentes.
O leitor poderia então questionar: é melhor deixar de reprimir o tráfico e deixar que traficantes controlem as favelas? Não se trata disso. Deixar de reprimir o tráfico não seria má ideia – por isso, os especialistas no assunto posicionam-se quase consensualmente a favor da legalização controlada das drogas –, mas deixar que traficantes armados controlem territórios é certamente um problema. Seria muito difícil imaginar qualquer solução para ele dentro do modelo proibicionista estabelecido e não seria esta a nossa proposta. Entretanto se faz preciso, pelo menos, apontar alguns dos motivos centrais pelos quais o projeto das UPPs não pode ser considerado uma solução milagrosa: 1)se pauta pela ideia de pacificação, que supõe a reconquista de territórios entendidos como perdidos pelo Estado e, portanto, se realiza através de ocupações militares, desvinculando-se por completo do que se entende por policiamento comunitário ou policiamento de proximidade; 2) está preocupado em impor verticalmente o ordenamento institucional-legal no espaço público das favelas, sem oferecer contrapartidas equivalentes no que diz respeito à oferta de serviços públicos; 3) não inclui propostas substanciais de reformulação da Polícia Militar, de maneira a propiciar alguma ruptura com o papel histórico desta corporação enquanto instituição especializada no controle dos pobres e manutenção das relações de dominação política e econômica.
Diante das atuais evidências de fracasso das UPPs, não cabe demandar pela “retomada” de territórios, pois eles jamais foram “perdidos” pelo Estado ou pelos traficantes. O problema foi sempre a qualidade da relação entre polícia e tráfico no espaço das favelas e a principal conquista das UPPs, até então, tinha sido aproximar tal relação dos modos normais observáveis na maioria das grandes cidades do resto do mundo. Erros consubstanciais à concepção do projeto resultaram no seu inevitável fracasso, adiado em alguns anos devido ao importante papel legitimador desempenhado pela imprensa. Culpar agora a “volta dos traficantes” e acusar moradores de protestarem a mando do tráfico constitui uma estratégia torpe de deslocar a questão e evitar problematizar alguns pontos nevrálgicos das UPPs. Tal cegueira intencional torna cada vez mais distante uma eventual tentativa de reformulação do projeto em vistas a manter suas poucas, porém significativas conquistas.

Coletivo Vinhetando 
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